10 de novembro de 2019

[anotações sobre magia e exploração]

[recapitulando]

Em "cultist simulator: qual a moral de um jogo", eu falei bastante sobre uma sensação especial que eu sinto com jogos, que eu chamei carinhosamente de "magia". Eu argumentei que essa "magia" está fortemente relacionada com o ato de não entender um jogo, e com a sensação de mistério e desconhecimento que você se sente quando tendo de jogar algo que você não entende. Com certa tristeza, eu comentei que conforme uma pessoa se torna fluente na linguagem comum dos videogames, essa magia acaba desaparecendo por completo, e nenhum jogo parece verdadeiramente "novo". Eu assinalei que uma solução trivial seria buscar jogos com designs inovadores, porque suas linguagens inéditas renovariam esse não-entendimento do suposto jogador.

Neste texto, pretendo dar prosseguimento a essa discussão, mas olhando por um outro ângulo. Até agora, estivemos analisando a magia como um reflexo da experiência do jogador: se o jogador é inexperiente, o jogo tem a chance de ser mágico; se o jogador é experiente, essas chances diminuem. Porém, o que eu vim a perceber é que existem jogos nos quais a magia é intencional, ao invés de um efeito secundário da inexperiência do jogador. Nestes jogos, o não-entendimento é a experiência pretendida pelo designer, e portanto diversas decisões são tomadas a fim de intensificar esse sentimento. Estes são o que eu chamo de "jogos de exploração", e serão o foco principal do texto que se segue.

parte 1: jogos de exploração, e "magia"

[o que são jogos de exploração?]

Em jogos, não existe um significado claro para o termo "exploração". Para alguns, exploração é sinônimo de "walking simulator"; para outros, de "open world". Aqui, nós estaremos interessados especificamente no termo "exploração motivada por curiosidade".

O termo "exploração motivada por curiosidade" foi cunhado por Alex Beachum em sua tese "Outer Wilds: A Curiosity-driven Space Exploration Game"1, na qual ele discute a direção criativa de Outer Wilds (jogo lançado em 2019 do qual falaremos mais adiante). Beachum utiliza as seguintes definições:

Portanto, para Beachum, a "exploração motivada por curiosidade" seria a coleta de informações sobre o ambiente, motivada pela vontade de entendê-lo.

Na vida real, exemplos desse tipo de exploração seriam: mergulhar no oceano para descobrir que criaturas vivem no fundo, escalar uma montanha para ver como é a vista lá de cima, e desenterrar artefatos para entender a cultura de uma civilização antiga. Em todos estes casos, o objetivo principal é o entendimento, e não algo externo como dinheiro ou fama. Um exemplo análogo em jogos seria entrar num túnel escondido para descobrir o que tem lá dentro, ao invés de entrar para ganhar um item ou coisa do tipo. A distinção é sutil, portanto vale a pena olharmos mais alguns exemplos.

Diversos jogos implementam algo parecido com túneis escondidos, e as motivações para explorá-los são das mais variadas:

Contraste estes exemplos com uma exploração motivada por curiosidade, na qual o jogador genuinamente deseja saber o que tem dentro do túnel:

Neste caso, o conhecimento do que tem dentro do túnel seria um fim em si mesmo, e não um meio para se obter alguma outra coisa. Na vida real, as motivações se misturam e é difícil dizer qual é qual - ainda assim, a diferença continua existindo.

[qual a relação entre exploração e "magia"?]

Tendo definido o que é exploração motivada por curiosidade, agora falaremos de sua relação com a tal da "magia". Esta relação pode ser descrita da seguinte forma:

  1. Se um dos focos do designer for estimular exploração motivada por curiosidade, então ele deverá estimular a curiosidade do jogador;
  2. Porém, um jogador não fica curioso com algo que ele já entende: por exemplo, se o evento do túnel se repetir diversas vezes, o jogador vai pegar o padrão e parar de perguntar "o que foi esse barulho?";
  3. Portanto, é do interesse do designer que o jogador sempre esteja encontrando coisas novas que ele não entende, ao invés de ficar encontrando os mesmos padrões antigos;
  4. Em outras palavras, o jogo estimula a todo momento o não-entendimento do jogador, e portanto cria oportunidades para que o jogador sinta a "magia".

Esta é a relação entre os dois: jogos de exploração propositalmente geram "magia".

Para um exemplo mais concreto, podemos olhar para Outer Wilds.

A única recompensa em Outer Wilds é conhecimento: não há itens, habilidades ou equipamentos. É possível zerar o jogo nos primeiros 10 minutos, se você souber o que está fazendo. A questão é que você não sabe, e a sua jornada ao longo do jogo é justamente descobrir o que fazer. Explicar as mecânicas, a narrativa e os lugares de Outer Wilds é dar spoiler de Outer Wilds, porque entender Outer Wilds é o jogo.

Em Outer Wilds, tudo é estranho e atua com base em regras que você não entende. Confusão e medo são constantes. Você nunca sabe o que tem no lado escuro do planeta ou embaixo da superfície. O jogo produz um sentimento de antecipação, de enfrentar o desconhecido, de poder ser surpreendido a qualquer momento, de não entender e continuar explorando, que é exatamente o mesmo que eu sentia com videogames quando era criança. Em outras palavras, Outer Wilds é bem "mágico".

Se Outer Wilds foi uma experiência mágica pra mim e para tantas outras pessoas, acho seguro dizer que é porque ele entende e capitaliza em cima da curiosidade e do não-entendimento. Afinal, Alex Beachum, que definiu o termo "exploração motivada por curiosidade", foi o diretor criativo de Outer Wilds, de modo que o jogo é praticamente o exemplo perfeito de sua definição.

Em suma, "jogos de exploração" são jogos que estimulam a curiosidade. Para isso, eles precisam a todo momento conjurar elementos misteriosos que escapem do entendimento do jogador, e consequentemente acabam gerando a tal da "magia" que eu tanto falei no outro texto.

Em seguida, vamos analisar em mais detalhes como jogos de fato implementam essa exploração.

parte 2: como jogos implementam exploração

Jogos diferentes implementam exploração motivada por curiosidade de formas diferentes. Porém, acredito que independente do jogo, toda exploração desse tipo segue a mesma estrutura:

  1. pergunta: o elemento que estimula a curiosidade do jogador. ex.: "o que tem dentro daquele túnel?"
  2. exploração: como a jogadora atua com base nesta curiosidade. ex.: a jogadora entra no túnel para descobrir a origem do barulho
  3. resposta: a solução obtida para a pergunta inicial após a exploração. ex.: era um tipo de inimigo inédito que vive em túneis.

Vamos pegar essa estrutura simples e trivial e inventar um monte de coisa pra falar sobre ela.

1. [perguntas]

Para estimular o jogador a fazer perguntas, é necessário cobrir duas bases: (1) incitar a curiosidade do jogador, e (2) garantir que as perguntas não serão repetidas.

1.1. [incitando a curiosidade do jogador]

Existem diversas formas de incitar a curiosidade do jogador. Eu não pretendo providenciar uma lista exaustiva, mas aqui estão algumas das formas mais comuns.

  1. "weenies": objetos distantes que chamam a atenção do jogador. "O que é aquilo?", "como eu chego lá?". É a forma mais básica, e muitos jogos fazem isso sem nem ao menos tentarem ser de exploração. Alguns jogos não fazem isso de forma visual, mas sonora: em Sexy Brutale, de todos os pontos do mapa você ouve vidro quebrando, mas nunca consegue ver a origem. Isso cria uma certa antecipação no jogador e abre espaço para ele ficar curioso.

  2. lendas de terras distantes: elementos distantes sobre os quais NPCs contam histórias ao jogador. Beachum apresenta esse tipo de pergunta em sua tese, e exemplifica com The Legend of Zelda: Wind Waker. No jogo, o fotógrafo Lenzo apresenta ao jogador diversas fotografias que tirou ao longo de suas viagens. A intenção é levar o jogador a se perguntar "o que é isso?", ou "esse templo parece interessante, como chego lá?".

  3. contradições: duas informações conflitantes que inerentemente requisitam uma solução, e geram uma pergunta. Exemplo: em Hollow Knight, há uma área subterrânea chamada City of Tears na qual chove eternamente. Caso o jogador esteja atento, ele chegará a uma contradição, e a uma pergunta: "chover no subsolo é impossível! o que está acontecendo?" Sua curiosidade poderá levá-lo a investigar Blue Lake - a área localizada imediatamente acima de City of Tears -, e descobrir que a chuva na verdade é um vazamento de água do lago.

  4. tartaruga em cima da árvore: uma situação que não é impossível, mas que merece algum tipo de explicação. Exemplo: em MapleStory, há um deserto repleto de cristais no chão. Não é impossível, mas leva o jogador a se perguntar: "por que eles estão aqui?"

  5. ovos: certos objetos inerentemente geram perguntas. Exemplos claros são ovos, portas e baús. Assim que um desses objetos é avistado pelo jogador, ele é estimulado a se perguntar "o que será que tem dentro desse ovo?", ou "para onde essa porta leva?".

1.2. [não repetindo perguntas]

Não é suficiente apenas incitar o jogador a fazer uma pergunta: é necessário garantir que esta pergunta não será repetida. Isso está de acordo com o que foi dito anteriormente, sobre como um jogador não faz perguntas para as quais ele já sabe a resposta. A curiosidade depende do desconhecido, e o desconhecido depende da não-repetição.

Isso eu posso explicar melhor com um exemplo. Quando eu joguei Breath of the Wild, descobri rapidamente que algumas pedras podem ser levantadas pelo Link, assim como em outros jogos. Não demorou muito até que eu encontrasse uma estrutura estranha no mapa, um círculo de pedras em que uma pedra estava claramente fora do lugar. Como um verdadeiro gamer, eu reconheço uma pista quando vejo uma, e imediatamente pus a pedra solta no lugar correto dela. O que será que iria acontecer? Eu estava curioso. Para minha surpresa, uma pequena criatura surgiu e me entregou um item: "Korok Seed". Então eu prontamente respondi: "Uau! Obrigado, camarada silvestre! Não tenho a menor ideia do que isso seja, mas guardarei com muito carinho!", e enfiei o item no meu bolso. Me senti bem.

E aí eu encontrei a mesma estrutura outras 50 vezes, e percebi que botar a pedra no lugar faltante sempre me dava a mesma recompensa. As pedras deixaram de ser um mistério, e passaram a ser uma placa de sinalização: "Korok Seed aqui". Eu nunca mais me perguntei qual seria o significado daqueles círculos de pedra, porque eu já sabia a resposta. Ou seja, a curiosidade morreu.

O caso das Korok Seeds é o cúmulo, mas a mesma coisa pode acontecer de formas muito mais sutis. Um outro exemplo da franquia Zelda são as "weak walls": paredes que podem ser destruídas com bombas. Eu lembro de quando era criança e encontrei a minha primeira, em Minish Cap: eu não fazia a menor ideia de como interagir com aquela parede, que chamava a atenção por ser tão diferente das demais. Eu talvez tivesse que usar algum item, mas qual? Foi só depois de muita experimentação que consegui explodi-la com uma bomba, e a musiquinha de segredo do Zelda tocou. Eu me senti um gênio, e estava extremamente curioso pra descobrir o que estava escondido por trás daquela passagem secreta.

Quem imaginaria que, 5 jogos e 15 anos depois, eu estaria explodindo as mesmas paredes? A cue visual é a mesma, o método de ultrapassar o obstáculo é o mesmo, e pra ser bem sincero, eu provavelmente sei o que tem atrás: uma caverna, um coração, ou se eu tiver sorte uma Fairy Fountain. É claro que varia de um jogo pro outro (agora não é uma caverna, é um Shrine! eba!), mas não o suficiente para me fazer sentir curiosidade genuína. "O que tem atrás daquela weak wall?" é uma pergunta que não instiga mais minha curiosidade, de tantas vezes que já foi perguntada, e de tão consistentes que foram as respostas. Pra que fazer uma pergunta se você já sabe a resposta?

Assim, a pergunta pode ser repetida não só dentro de um mesmo jogo (como a Korok seed), como também ao longo de diversos jogos (como as weak walls). Para manter a curiosidade do jogador, é necessário que o jogo fuja de padrões fáceis, ao mesmo tempo que tenta quebrar com a linguagem tradicional de videogames.

2. [exploração]

Depois das perguntas, vem a exploração: a coleta de informações sobre o ambiente que o jogador faz para responder sua pergunta.

Para haver exploração, é necessário que o jogador possa atuar com base na sua curiosidade. Isso é mais complexo do que parece, porque é necessário garantir que as perguntas são acionáveis. Vejo duas questões a serem cobertas:

2.1. [liberdade]

O jogador deve ter a liberdade de coletar as informações sobre o ambiente. Isso significa que se um jogo me apresenta uma estrutura curiosa no horizonte e instiga minha curiosidade, ele também tem de me fornecer as mecânicas necessárias para ir até lá saciar minha curiosidade. Não precisa ser imediato ou fácil, mas é uma promessa que tem de ser cumprida. Muitos jogos não permitem ao jogador sair dos limites da fase e põem essas estruturas apenas como background, como um tease. Não tem problema, às vezes o objetivo do jogo não é esse - mas isso limita seu potencial de gerar exploração motivada por curiosidade.

2.2. [direcionamento]

O jogador deve ter o direcionamento necessário para saber como coletar as informações sobre o ambiente. Mencionamos que em The Legend of Zelda: Wind Waker, há um personagem que apresenta fotografias de locais distantes e interessantes, com o objetivo de deixar o jogador curioso. Vamos supôr que uma dessas fotos me interessou, e que eu quero saber mais sobre a ilha que foi fotografada. Como eu atuo com base nisso? Eu só tenho uma foto! É necessário que o jogo me dê algum tipo de direcionamento (como por exemplo, "esta foto foi tirada a norte daqui") para que eu possa explorar de fato, e buscar as respostas. Caso contrário, eu certamente ficarei entusiasmado ao encontrar a ilha na qual a foto foi tirada, mas será completamente por acaso.

Sem liberdade e direcionamento, o jogador fica curioso mas não explora. Portanto, estas são peças fundamentais do mecanismo.

3. [respostas]

Por fim, a exploração deve culminar em uma resposta: a solução para a pergunta inicial. Para isso, é necessário que o designer garanta duas coisas: (1) que haja uma resposta, e que (2) ela esteja escondida.

3.1. [devem haver respostas]

Um exemplo de jogo que não oferece respostas é Shadow of the Colossus. O jogo é de mundo aberto, e o jogador pode ir para onde quiser, quando quiser. Há diversos elementos no mapa que instigam a curiosidade do jogador: estruturas arquitetônicas estranhas, biomas extensos. O que tem atrás daquela montanha? E no fundo daquele lago? É um jogo que certamente incita perguntas... mas que não oferece nenhuma resposta. Nunca tem nada atrás da montanha ou dentro do lago: as Forbidden Lands são tão vazias quanto são extensas. É claro que isso é proposital, e desempenha um papel importante na ambientação: solidão e abandono são temas consistentes ao longo do jogo. Mas também significa que ele não é um jogo de exploração motivada por curiosidade.

No âmbito narrativo então, o não-oferecimento de respostas é ainda mais comum. Em Mario, você pode até exibir curiosidade e fazer perguntas sobre o jogo: "por que Goombas são cogumelos?", "por que o castelo do Bowser fica aqui?", mas você sabe que esse tipo de pergunta não será respondida dentro do jogo, provavelmente porque nem tem uma resposta muito mais elaborada do que "porque sim". Nessa dimensão narrativa, Mario não estimula curiosidade, já que ele não te dá nenhuma perspectiva de obter as informações almejadas.

Um jogo que não oferece respostas é como um professor ruim: depois de um tempo, você só para de perguntar.

Em contrapartida, alguns jogos são como bons professores, e têm uma resposta para tudo. Dark Souls é um dos exemplos mais icônicos disso, pela forma como ele oferece respostas narrativas não só para mecânicas que são tidas como tradicionais (respawn, multiplayer), mas até coisas absurdas que ninguém pediu pra ele justificar (por que jogadores diferentes existem? o que acontece quando um jogador desiste?). Dark Souls é icônico porque extrapolou a barra - ele não precisava ter ido tão longe. Mas o público percebe que ele tem as respostas: Dark Souls é um professor atencioso, então podemos perguntar.

O meu exemplo pessoal com Dark Souls é em Darkroot Garden: uma floresta em que os dois principais inimigos são homens-planta e armaduras animadas. É bem no começo do jogo, e eu achei estranho - por que esses dois tipos de inimigos? Não fazia muito sentido, mas eu aceitei, porque era o início do jogo e eu não sabia que Dark Souls era um jogo com respostas. Mais pra frente no jogo, eu visitei a mesma área, só que centenas de anos no passado - naquela floresta havia um vilarejo em que os habitantes praticavam "um tipo estranho de mágica", que o jogo nunca te diz qual é. Nessa área, os inimigos não eram homens-planta e armaduras animadas, mas fazendeiros e guardas. Eu achei isso meio estranho. Mas foi quando parei pra prestar mais atenção que eu percebi: os fazendeiros não eram humanos, mas plantas! E os guardas eram armaduras! Os aldeões usaram sua "magia estranha" para animar objetos inanimados e utilizá-los como mão de obra. Podemos inferir que depois que a vila foi destruída, as criaturas enfeitiçadas continuaram rondando a região, ainda atuando de acordo com seu propósito original de defender o território, e atacando o jogador no "tempo presente".

Foi uma sensação muito gostosa perceber isso, e notar como o jogo é tão "fechadinho". Em Dark Souls, tudo tem alguma explicação. Depois dessa experiência, eu comecei a ver o jogo com outros olhos, e comecei a questionar e entender muitos outros elementos da lore - um nível de engajamento que eu nunca teria em jogos que não prometem respostas.

3.2. [as respostas devem estar escondidas]

Também devemos destacar que só dar a resposta não basta - além disso, é preciso escondê-las. Dark Souls poderia muito bem ter botado um NPC no fim da área que me descrevesse toda a história do vilarejo, e que me dissesse a origem dos inimigos - exatamente como o Codex de Mass Effect faria. Dessa forma, o jogo teria me permitido fazer uma pergunta, teria me deixado explorar, e por fim teria me oferecido uma resposta. Isso significa que ele seria um exemplo de exploração motivada por curiosidade? Creio que não.

Se você der as respostas de mão beijada para o jogador, ele não precisará coletar informações sobre o ambiente para responder a pergunta, e portanto por definição não haverá exploração. É preciso esconder a resposta de forma sutil, como um desafio apenas para os jogadores realmente curiosos e atentos: dar pistas no design das fases, no design dos inimigos, no diálogo dos NPCs e até mesmo na posição dos itens. Dark Souls também entende essa parte perfeitamente.

Podemos olhar para "tutoriais" através dessa mesma lente, como sendo uma expressão mecânica de respostas de mão-beijada. Não acho que seja uma coincidência que jogos como Outer Wilds e Dark Souls, que tanto se fundamentam na curiosidade e exploração do jogador, frequentemente não apresentem tutoriais para suas mecânicas. Lembra-se de quando eu perguntei "o que o ciclone faz?"? É, então, só tem uma forma de descobrir: explorando. Se o jogo te apresentar um pop-up em seguida dizendo o que ciclones fazem e qual a função deles na fase, ele vai estar fazendo o que eu disse que o NPC faria: dando a resposta sem permitir você explorar. É por isso que existe uma sobreposição tão grande entre "jogos de exploração" e "jogos que tem pouco ou nenhum hand-holding": porque quando você não dá informação ao jogador, ele obrigatoriamente tem de explorar para obtê-la. Não ter hand-holding é esconder as respostas, e incentivar a exploração no jogador.

conclusão: um adendo final

Em "cultist simulator: qual a moral de um jogo", eu reclamei que Cultist Simulator é maneiro, mas quando você entende o jogo, ele vira um clicker. Pois bem, compare isso com Outer Wilds: quando você entende Outer Wilds, o jogo acaba. Você descobre o que tem de fazer pra zerar o jogo, vai lá e zera.

Isso é maneiro pra caramba, mas de certo ponto de vista, não parece muito especial. Afinal, existem outras experiências que seguem uma linha parecida, os exemplos mais clássicos sendo histórias de detetive e puzzles. Numa história de detetive, quando você descobre "quem é o assassino", a história acaba. E num puzzle, quando você descobre "como colorir o cubo", o puzzle acaba. Ou seja, existem experiências além de jogos de exploração que também são fortemente orientadas a respostas, e fortemente conectadas ao thrill do mistério, que é uma forma adequada e mais objetiva de descrever a "magia" que eu tanto falo.

Talvez exploração não seja tão especial assim, então, mas ainda é especial o suficiente pra mim. Afinal, uma outra similaridade entre essas três experiências - jogos de exploração, histórias de detetive e jogos de puzzle - é que eu gosto muito das três. Jogos de puzzle sempre foram um dos meus gêneros favoritos. Eu devo ter uns 30 livros da Agatha Christie na minha estante (alguns lidos mais de uma vez). E agora, eu passei alguns meses tentando escrever um texto sobre jogos de exploração.

Em retrospecto, talvez eu só goste muito de mistérios.


  1. Outer Wilds: A Curiosity-driven Space Exploration Game


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