reflexões curtas sobre os livros que eu li em 2021, em ordem razoavelmente cronológica. como tudo na vida, 90% é meio "meh", então eu destaquei os que mais me impactaram.
como vai ficar claro, esse foi um ano em que eu pensei muito sobre atenção. por um lado, foi uma continuação natural de 2020, em que eu li bastante sobre meditação e mindfulness. por outro lado, foi uma tentativa de não desligar completamente o meu cérebro durante o segundo ano seguido em que eu passei 95% do tempo no mesmo cômodo.
se tem algum livro que você acha que eu gostaria, ou se você seguiu alguma recomendação minha e se arrependeu, ou se você simplesmente acha que gostaria de conversar comigo - por favor, me mande um e-mail!! eu adoro receber mensagens e conversar com pessoas!! em grande parte, eu escrevo coisas pra conhecer pessoas, então seu contato será bem-vindo :)
Por que o budismo funciona (Robert Wright) ⭐
esse é um livro popsci (mais pesado no sci) que procura explicar o budismo e as práticas meditativas de forma razoavelmente técnica e sistemática. eu achei muito bem escrito e foi um daqueles livros que me deixou temporariamente mais consciente dos meus pensamentos e sentidos (isso acontece quando eu leio bons livros sobre o assunto)
o livro tem muitas ideias interessantes: a visão da mente humana como um conjunto de módulos que lutam pela atenção do indivíduo; a imagem mental de pensamentos como iscas; toda a questão de “rede padrão” e o foco no futuro/passado... de fato, o DNA do meu texto “já fazem anos que eu não tomo banho” vem todinho desse livro.
eu recomendaria esse livro pra alguém cético sobre meditação/mindfulness, considerando que o autor também vem de um lugar extremamente cético. em particular, acho que esse livro cai muito bem depois de “Stumbling on Happiness”, já que ambos lidam com o conceito de “o ser humano percebe um mundo ilusório” mas de formas diferentes
A Peste (Albert Camus)
comecei a ler porque estamos em uma pandemia. não terminei de ler porque ainda estamos em pandemia
Seasonal Associate (Heike Geissler) ⭐
esse livro é um “diário” escrito em segunda pessoa por uma escritora alemã que, por falta de dinheiro, acaba tendo que trabalhar num armazém da Amazon. essa é a descrição factual; uma descrição mais acurada seria dizer que esse livro é um portal pra um sonho de outra pessoa, e também é um detalhamento do que significa o “soul-crushing” em “soul-crushing job”.
a autora conseguiu me transportar pra vida dela de um jeito que eu não me lembro de ter sentido antes. o livro não mudou a minha visão de mundo mas foi uma experiência única. ironicamente, foi o primeiro livro que eu li no Kindle que comprei em fevereiro.
You’re not dead, that much is for sure. Your potential lies deeper than usual, buried beneath your fatigue.
How to Do Nothing (Jenny Odell) 💖
as pessoas mais inteligentes do planeta estão dedicando suas vidas a te fazer ficar mais tempo olhando pro celular. disso, você já sabe. mas e agora?
esse é de longe o meu livro favorito de 2021.
o livro passa a sensação de ser uma longa conversa centrada no conceito de “atenção”, com uma amiga próxima que é muito inteligente e gentil. são tantas coisas que me tocaram aqui que eu não sei nem por onde começar: a importância do físico e real como respostas ao digital e ilusório; o papel da atenção como forma de sair da própria cabeça, e de efetivamente reduzir a ansiedade; a noção de que fugir da civilização não é a melhor escolha; o argumento de que “conhecimento inútil” adiciona camadas à nossa percepção e aprofunda a complexidade do mundo... é porrada atrás de porrada. eu sei que essa lista de coisas não faz sentido pra mais ninguém, mas eu não consigo escrever um ou dois parágrafos sobre esse livro; eu vou levar uns anos pra processar tudo aqui.
talvez a coisa mais clara que eu possa dizer sobre “How to do nothing” é a seguinte: ele foi unicamente responsável por me fazer ingressar em um hobby envolvendo plantas e outro envolvendo pássaros. acredito que seja, como os jovens dizem, “sobre isso”.
se você leu o livro, recomendo o vídeo da Cristal Muniz, é muito bom. e a capa do livro em português é absolutamente asquerosa, o que dói mais ainda quando sabe-se que a capa em inglês é linda.
We experience the externalities of the attention economy in little drips, so we tend to describe them with words of mild bemusement like “annoying” or “distracting.” But this is a grave misreading of their nature. In the short term, distractions can keep us from doing the things we want to do. In the longer term, however, they can accumulate and keep us from living the lives we want to live, or, even worse, undermine our capacities for reflection and self-regulation, making it harder, in the words of Harry Frankfurt, to “want what we want to want.” Thus there are deep ethical implications lurking here for freedom, wellbeing, and even the integrity of the self.
No Sense of Place (Joshua Meyrowitz)
a história desse livro é um pouco engraçada. acho que a Jenny Odell cita ele em algum momento de “How to do nothing”, e só de ver o nome eu já fiquei interessado: eu frequentemente penso na dicotomia entre o físico e o virtual (como escrevi em “um relato pessoal sobre a fusão de dois mundos”), e o tema pareceu bem no meu beco. de fato, quando eu li a sinopse desse livro, literalmente lacrimejei de antecipação: “finalmente!!!! o livro que eu preciso!!!”
infelizmente o livro não tem NADA a ver com o que eu imaginava e eu abandonei no segundo capítulo
Becoming Animal (David Abrams)
esse é um dos livros frequentemente citados pela Jenny Odell e com razão: ele é basicamente uma série de reflexões sobre uma forma específica de se relacionar com a natureza, uma forma predicada na fisicalidade e no reconhecimento da nossa própria mortalidade.
é difícil dizer exatamente sobre o quê é o livro, mas o que eu posso dizer é que a leitura me fez ter mais pensamentos sobre o “aqui e agora” e sobre a beleza da natureza, o que sempre é um ótimo sinal pra mim - eu adoro livros que fazem eu ficar mais presente/consciente, nem que seja temporariamente enquanto eu estou lendo.
na verdade eu gostei tanto do livro que eu comecei a ler ele de forma cada vez mais lenta, porque eu queria realmente “saborear” a experiência, e a leitura ficou tão lenta mas tão lenta que eu parei na metade. um dia retornarei
It is only now, as we find both our lives and our high-tech laboratories threatened by severe fluctuations in the weather, as we watch coastlines disappear and foodwebs collapse and realize that our own children will not be exempt from the violence that our onrushing “progress” has inflicted upon the earth, only now do we notice that all our technological utopias and dreams of machine-mediated immortality may fire our minds but they cannot feed our bodies.
Amusing ourselves to death (Neil Postman)
o nicky case botou esse livro como um dos que marcou elx ao longo da vida, com a enigmática frase “this book sparked my techno-dystopian thoughts”. fiquei intrigado e fui ler.
em resumo, é um livro de 1986 sobre como “TV is bad, guys!”. apesar da idade, o livro é surpreendentemente atual: diversas coisas que ele critica na TV são muito piores nas redes sociais. por exemplo, ele fala sobre o “colapso contextual” (como em um programa de notícias, é totalmente normal você falar sobre a morte de uma criança e depois da previsão do tempo), e esse tipo de coisa só piorou de lá pra cá. acho que neil postman teria um ataque cardíaco se entrasse no twiter, ou se assistisse a “welcome to the internet” do bo burnham.
além disso, eu já sabia que “estar sempre informado” não é algo produtivo ou mentalmente saudável, mas esse livro ajuda a enfatizar o ponto. existem alguns pontos que eu gostaria de discutir mais a fundo (p.ex. até que ponto é importante dar atenção a toda merda que o bolsonaro fala?) mas num geral acho que concordo com a análise do autor. ele também traz uma perspectiva histórica que achei interessante (como era antes da TV e do rádio? jornais tinham o mesmo problema?). também achei interessante como ele fala sobre os vieses invisíveis da TV (”parar e pensar” é algo chato de ser assistido e então existe uma tendência a incluir pessoas que falam sem pensar; falar com confiança é pré-requisito; não existe mais presidente obeso; etc)
é legal, me fez ter pensamentos sobre coisas. só não explodiu nenhuma parte do meu cérebro
If on television, credibility replaces reality as the decisive test of truth-telling, political leaders need not trouble themselves very much with reality provided that their performances consistently generate a sense of verisimilitude.
Staying with the trouble (Donna J. Haraway)
eu queria muito ter gostado desse livro por conta do título que é muito legal, mas por mais que eu tenha tentado, simplesmente não entendi porra nenhuma. acontece
Become what you are (Alan Watts)
eu adoro o Alan Watts com força, e ouvir ele falando é uma das coisas que mais consistentemente pacifica meu coração. o livro aborda assuntos que eu já tinha tido algum contato durante as palestras dele, então eu já sabia o que esperar. foi exatamente o que eu esperava, e foi ótimo. virou um daqueles livros que eu folheio com frequência
A successful merchant will perhaps be less ready than a mere tramp to see that the same oblivion engulfs both of them.
The subtle art of not giving a f*ck (Mark Manson)
esse é engraçado. pra mim o Mark Manson sempre vai ser aquele gringo safado que escreveu uma carta reclamando do brasil (os caras elegeram o trump! vai dar lição de moral na casa do caralho ô babaca), então eu sempre ignorei esse livro quando via ele nas livrarias (e ele estava em muitas livrarias). de fato, não lembro exatamente porque que eu fui ler ele agora, mas provavelmente devo ter visto uma recomendação em algum lugar.
considerando minhas expectativas baixas, fui positivamente surpreendido pelo primeiro capítulo do livro: ele fala sobre ansiedade, e como o estado humano de perpétua insatisfação deve ser levado a sério, e sobre como é necessário enfrentar a ansiedade ao invés de deixar ela limitar sua vida, etc. auto-ajuda bem básica, nada novo - mas com uma linguagem direta que me deixou interessado pra ver o resto.
infelizmente, o segundo capítulo foi só ladeira abaixo: a escrita fica muito mais entediante (e às vezes condescendente) e as ideias não são boas ou novas. a parte que ele começa falar do panda me fez rolar os olhos com tanta velocidade que eles sairam correndo
Kids These Days: Human Capital and the Making of Millennials (Malcolm Harris)
um livro sobre millennials e as forças sistêmicas que moldaram a geração. apesar de ser EUA-cêntrico, consegui empatizar com algumas das ideias: como as empresas terceirizam o treinamento e esperam que os funcionários já tenham sido treinados antes da contratação (normalmente com o discurso de que a pessoa tem que usar o tempo livre pra “se atualizar”); como isso se conecta à precariedade da gig economy (é necessário estar sempre se reinventando e aprendendo coisas novas pra se encaixar em alguma engrenagem do setor de serviços); como a infância deixou de ser um momento pras crianças aprenderem errando e se tornou um dos momentos mais aversos a riscos (”childhood is no longer a time to make mistakes, now it’s when bad choices have the biggest impact”).
acabei parando no meio porque, apesar de ser um retrato interessante da geração millennial (com a qual empatizo, apesar de não pertencer totalmente), acho que estava simplesmente cansado de ver coisas sobre os estados unidos. safoda eles
Post-Truth (Lee McIntyre)
esse eu li como pesquisa pro meu texto sobre a diferença entre piada e fake news. não lembro de nada, mas tenho certeza que na hora foi útil!
Walkscapes: walking as an aesthetic practice (Francesco Careri)
não passei do prefácio porque não era o que eu queria ler no momento, mas uma ideia do próprio prefácio já me impactou bastante:
Walking in South America means coming to terms with many fears: fear of the city, fear of public space, fear of breaking rules, fear of usurping space, fear of crossing often non-existent barriers, fear of other inhabitants, nearly always perceived as potential enemies. To put it simply, walking is scary, so people don’t walk any more; those who walk are homeless, drug addicts, outcasts. The anti-peripatetic and anti-urban phenomenon is clearer here than in Europe, where it still seems to only be on the verge of taking form: never leave the house on foot, never expose your body without an enclosure, protect it in the home or in the car. Above all, never go out after sundown! Shut yourself up, if possible, in gated communities to watch terrifying films or to travel with the Internet. Commit advertising to memory so you will know what to look for when you’re strolling in shopping malls. At architecture schools I realized that the students, the future ruling class, know everything about urban theory and French philosophers; they say they are experts on cities and public space, but actually they have never had the experience of playing soccer in the street, of meeting friends at the square, of making out in a park, or sneaking into an industrial ruin, crossing a favela, stopping to ask a stranger for directions. What kind of city could ever produce these people who are scared of walking?
well DAMN
The Denial of Death (Ernest Becker)
esse é pesado. o autor era antropólogo e o livro explora o papel da negação da morte em diversas partes da sociedade e do desenvolvimento da personalidade dos indivíduos. aqui eu encontrei ideias novas que fizeram muito sentido pra mim, por exemplo: como o ser humano é uma entidade trágica por ter um intelecto imortal mas um corpo frágil (”man is a god who shits”); como diversos aspectos da personalidade estão conectados à diferentes formas da criança reagir ao fato de que vai morrer um dia; como o impulso criativo e a vontade de “deixar um legado” são apenas tentativas de negar a morte por auto-identificação com algo imortal; etc. eu gostei, várias ideias interessantes.
por ser centrado no tema da morte, eu inevitavelmente fiquei pensando na morte durante as diversas semanas que passei lendo. isso é algo positivo ao meu ver porque lembrar da morte é muitas vezes um wake-up call importante, mas esse livro aqui tem que ir com calma porque honestamente às vezes é meio pesado.
This is the terror: to have emerged from nothing, to have a name, consciousness of self, deep inner feelings, an excruciating inner yearning for life and self-expression—and with all this yet to die.
Busy Doing Nothing (Rekka Bellum and Devine Lu Linvega) ⭐
o diário de bordo de 100rabbits: dois indie devs que vivem num barco e fazem coisas. eu amo amo amo amo eles dois, toda a proposta do site deles e da jornada deles é algo que me enche de paixão, tem tantas coisas que me deixam simplesmente FELIZ sobre a existência dessa dupla que eu não sei o que comentar: o fato de que eles escrevem ferramentas do zero (que provavelmente ninguém usa?); o fato de que todo projeto deles tem um mascote super-bem desenvolvido pela Rek (que é algo que eu sempre quis fazer mas achei que estava MALUCO); o fato de que os projetos deles são completamente diversos e a chance deles lançarem um jogo é tão grande quanto a chance deles lançarem um livro; o fato de que eles viajam na porra de um BARCO. entre outros.
eu acompanho o trabalho deles há alguns anos e quando vi que eles estavam vendendo um livro pelo itch.io por cinco dólares (trinta reais), foi uma decisão fácil. o livro em si é um diário de bordo da viagem deles entre o japão e o canadá, e como não acontece porra nenhuma em alto-mar, a leitura é frequentemente monótona e ineventuosa. pode parecer ruim mas pra mim isso é parte do que torna o livro tão impactante - justamente pela descrição do rotineiro, ele me fez sentir o psicológico da dupla, e como eles realmente vivem e pensam (além da descrição simples de “eles vivem num barco!! porra!!).
eu saí do livro não só com a confiança de nunca querer andar de barco sozinho, mas também com um respeito gigantesco pelos dois, não só pela coragem e perseverança de seguirem os próprios princípios, mas pelo fato deles terem esses princípios em primeiro lugar e expressarem isso de forma tão única. eu GOSTO deles ta bom
Cradled by waves, I stared into the depths and felt dizzy. I’d rather not spend too much time thinking about the enormity of the world’s oceans. They are large and wild spaces between continents, and humans, blinded by hubris, build and wear their boats like armor to cross them. Madness.
In Praise Of Idleness and Other Essays (Bertrand Russell)
entusiasmado pelo tema de “não fazer nada” do Busy doing nothing, acabei indo ler um outro clássico sobre ócio que eu nunca tinha lido. infelizmente achei chato pra cacete
“Steal Like an Artist”, “Keep Going”, “Show Your Work!” (Austin Kleon) ⭐
certo dia eu estava entediado e decidi ir na página de “activity” do neocities, que é basicamente um feed com todas as últimas atualizações feitas em todos os sites do neocities (como não tem nenhum tipo de filtro a não ser “coisas que foram recentemente atualizadas”, é uma ótima forma de descobrir coisas novas). nessa brincadeira eu encontrei um site de um escritor de nova york que estava tentando publicar um livro, ou algo do tipo, e em uma das páginas ele citava esses livros do austin kleon como inspiração, e foi assim que eu encontrei essa recomendação. é assim que eu arranjo livros pessoal caso vocês tenham tido essa curiosidade.
os livros do Austin Kleon (pelo menos esses que eu li) são escritos no formato de “lista”: cada capítulo é centrado ao redor de um conceito-frase (”When in Doubt, Tidy Up”, “Build a Bliss Station”, “The Ordinary + Extra Attention = The ExtraOrdinary”), e as ideias são desenvolvidas não só pelo texto do autor, mas por diversas citações e imagens relacionadas. o resultado é que cada capítulo parece um blog post + colagem, o que parece meio bobo mas felizmente são blog posts e colagens super interessantes.
eu acho que os livros são ótimos estimulantes se você tem projetos criativos, e eu recomendo tranquilamente - os capítulos são auto-contidos e se você não gostar de uma ideia é só pular pra próxima. o autor também cita uma quantidade enorme de artistas e trabalhos, então eu saí de lá com uma pilha de recomendações que durou meses - o que também é algo que eu valorizo imensamente!
It’s not the book you start with, it’s the book that book leads you to.
October Country (Ray Bradbury)
um livro de contos do Ray Bradbury, autor de Fahrenheit 451. foi o primeiro livro de contos de ficção que eu li em muuuito tempo, e foi uma experiência agradável! as histórias são centradas num terror meio “carnavalesco / halloween americana” que acaba sendo divertido e memorável. acabei não lendo todas as histórias mas me abriu um apetite anteriormente inexistente pra livros de contos.
His teeth began to chatter. God All-Mighty! he thought, why haven't I realized it all these years? All these years I've gone around with a--SKELETON--inside me! How is it we take ourselves for granted? How is it we never question our bodies and our being?”
A Philosophy of Walking (Frederic Gros)
o meu kindle está dizendo que eu li esse livro inteiro, e de fato, tem várias anotações e comentários - mas eu absolutamente não lembro de ter lido esse livro. eu estou com medo
Elsewhere, U.S.A.: How We Got from the Company Man, Family Dinners, and the Affluent Society to the Home Office, BlackBerry Moms, and Economic Anxiety (Dalton Conley)
outro livro sobre diferenças geracionais, focado nos aspectos econômicos, sociais e tecnológicos que criaram uma sociedade obcecada com “a próxima coisa”:
Those Americans who live in this “Elsewhere Society” are only convinced they’re in the right place, doing the right thing, at the right time, when they’re on their way to the next destination.”
eu me lembro de ter achado o livro interessante enquanto lia, mas sendo sincero, não consigo me lembrar de absolutamente nada. acho que é o velho caso de influência inconsciente: tem diversas passagens do livro que eu marquei no Kindle, e que apesar de me parecerem ideias super óbvias, provavelmente são óbvias justamente porque eu li esse livro... acontece. parece eua-cêntrico também
Why Greatness Cannot Be Planned (Kenneth O. Stanley and Joel Lehman)
a premissa é a seguinte: se você quer alcançar um objetivo ambicioso e distante (p.ex. ficar rico, ser feliz, escrever um livro de sucesso), a melhor forma de fazer isso NÃO é tomar ações com base no quão próximas elas estão do seu objetivo, mas sim tomar ações com base no quão interessantes elas parecem, sendo “interessante” um critério subjetivo que engloba tanto “novidades” quanto “intuição”.
a justificativa é que quando o objetivo está muito distante, não temos o conhecimento necessário pra traçar um caminho até ele - então qualquer caminho que seja traçado nesse sentido vai ser uma “bússola falsa” que nos leva a becos sem saída. o verdadeiro caminho até o objetivo ambicioso envolve coisas que não tem nada a ver com o objetivo em si: carros não são cavalos mais rápidos, o macintosh se destacou pela sua interface slick porque o steve jobs tinha feito aulas de tipografia, etc.
além dessa justificativa intuitiva, os autores também são pesquisadores de inteligência artificial e trazem resultados dessa área, que foi como eu os conheci (o Ken Stanley é o autor do NEAT).
a ideia é intrigante e me fez sentir reassured por não ter objetivos claros de longo-prazo. também é uma ideia que eu tenho pensado cada vez mais durante a pesquisa da minha tese - não dá pra saber o que vai dar certo e o que não vai, e às vezes a gente tem que ir na base da intuição. o que mais eu posso pedir de um livro, além de uma ideia curiosa e nova que me faz refletir sobre a vida?
tendo dito isso... se você se interessou pela discussão acima, é mais fácil simplesmente assistir ao episódio de Machine Learning Street Talk em que eles conversam com um dos autores sobre o livro. um dos entrevistadores faz um resumo excelente do livro, e a conversa/debate subsequente, por ter pessoas que discordam da premissa do autor, é estimulante de uma forma que o livro não é. se você gostar aí você lê o livro
The idea that all our pursuits can be distilled into neatly-defined objectives and then almost mechanically pursued offers a kind of comfort against the harsh unpredictability of life. There’s something reassuring about the clockwork dependability of a world driven by tidy milestones laid out reliably from the starting line.
The Wander Society (Keri Smith)
em The Wander Society, a autora reconta uma jornada literária que ela teve depois de ler Walt Whitman e se apaixonar pela ideia de reconexão com o mundo:
Reading Walt Whitman woke up a part of me that wants to run and yell and punch things. It’s a feeling similar to when I am working on a creative project and a new idea comes in, and I know I am fully alive and awake and ready to take over the world.
o livro em si é uma coletânea de pensamentos vagamente centrados em: caminhadas como prática estética/filosófica, recusa à obsessão com produtividade, enaltecimento do tédio etc; todo o conjunto de ideias que também são exploradas em “How to do nothing” e “A Philosophy of Walking”. o que deixa esse livro engraçado é que as ideias são apresentadas de forma semi-narrativa, guiadas pelo envolvimento crescente da autora com uma sociedade secreta chamada “The Wander Society”.
o livro pra mim foi só mais uma ênfase de ideias antigas (o que é sempre bem-vindo), e não acho que seja interessante como uma apresentação a essas ideias em si. o que extraí de mais valioso aqui foi a lista enorme de referências a outros livros. feed me mommy
The Art of Noticing (Rob Walker) 💖
nesses livros que eu tenho lido, é comum encontrar discursos de apologia ao tédio e à observação atenta do ambiente, em contraste ao caminho de menor resistência que é entregar nossa atenção aos tech overlords, em troca de injeções erráticas de dopamina. isso faz sentido no mundo das ideias, mas e se os arredores forem chatos pra caralho? e se você simplesmente não souber no que prestar atenção? de fato, o que significa “observar atentamente o ambiente”?
em The Art of Noticing, o autor apresenta “131 ideias pra estimular a criatividade, encontrar inspiração e descobrir alegria no cotidiano”. é uma série de prompts que trazem novas formas de como engajar com o mundo - algumas muito simples (“foque em uma cor e procure quais os objeto daquela cor que você encontra durante a caminhada”, “visite o mesmo lugar todos os dias e veja como ele varia“, “ande na direção do silêncio”) e outras mais complicadas (”almoce em um restaurante duvidoso”, ”passe num teste de turing ideológico”, “desenhe ao invés de fotografar”).
eu achei o livro extremamente ESTIMULANTE e virou um livro de cabeceira FÁCIL. posso dizer com segurança que esse livro fez minhas caminhadas matinais de 2021 muito mais surpreendentes e agradáveis, e a ideia de continuar experimentando com os prompts me enche de entusiasmo. recomendação fácil pra qualquer um que quer substituir o uso do celular outdoors mas adoraria sugestões sobre o quê substituir.
The Lost Art of Reading Nature's Signs (Tristan Gooley)
outro livro sobre “no que prestar atenção”, mas dessa vez focado na natureza. o autor é um sherlock holmes biólogo que consegue deduzir coisas sobre o ambiente (quando vai chover, qual a direção do mar, se algo é comestível ou não) baseado em coisas invisíveis para nossa imbecilidade urbana (marcas de musgo nas pedras, diferença na espessura do tronco das árvores, tamanho dos arbustos). o livro é um manual nesse sentido.
eu achei o tema interessante, mas parei de ler no começo porque estava me dando uma vontade inaplicável de ir pro meio do mato botar essas informações em prática. continuar lendo estava sendo um exercício em edging
The Mushroom at the End of the World : On the Possibility of Life in Capitalist Ruins (Tsing, Anna Lowenhaupt)
é sobre capitalismo e cogumelos
A Field Guide to Getting Lost (Rebecca Solnit)
eu não tenho as sinapses necessárias para falar sobre esse livro
Meno says, Mystery. Socrates says, On the contrary, Mystery. That much is certain. It can be a kind of compass.
Life a User's Manual (Georges Perec) 💖
um livro de ficção que reconta a história de um prédio residencial em paris, com cada capítulo focando num cômodo diferente. o livro é descrito às vezes como “uma tapeçaria de histórias”, e acho que é uma descrição apta. em resumo: é um lindo tomo de puro sonder.
eu escrevi em detalhes sobre o livro no meu texto ruas vazias e pessoas-fantasmas.
Pilgrim at Tinker Creek (Annie Dillard)
ainda não estou pronto. retornarei.
Cosmic Consciousness (Richard Maurice Bucke)
um livro escrito em 1901 sobre a psicologia de eventos místicos e de seres com “níveis elevados de consciência”. eu não sei o que estava esperando aqui, mas certamente não era uma quantidade cavalar de racismo e machismo
(entendeu, cavalar, porque naquela época eles andavam a cavalo)
On Looking: Eleven Walks with Expert Eyes (Alexandra Horowitz)
a ideia é a seguinte: todo dia a autora caminhava pela sua vizinhança em nova york, fazendo mais ou menos o mesmo agradável trajeto. mas depois de um certo tempo, o percurso ficou tão familiar que ela começou a ter dificuldades de prestar atenção no ambiente, e a caminhada rotineira virou piloto automático. certamente ela já tinha extraído tudo que dava pra extrair daquele percurso e estava na hora de mudar de trajeto, não é?
em cada capítulo desse livro, a autora chama um “especialista” diferente pra fazer a mesma caminhada em nova york, e ela registra as coisas em que o especialista presta atenção - como ele vê o mundo. a lista de “especialistas” inclui um geólogo, um biólogo, uma pessoa cega, uma criança, e assim por diante. sob os olhares dessas pessoas, a autora começa a enxergar coisas que ela nem sabia que existia, e a percepção dela sobre o mundo é fundamentalmente alterada...
a premissa do livro é encantadora, e eu cheguei preparado pra esmagar o fodendo botão de like. infelizmente, altas expectativas são responsáveis por 37% dos acidentes de trabalho por todo o brasil, e a leitura ficou um pouco aquém do que eu esperava: o problema é que estamos recebendo a informação de terceira mão aqui, o especialista fala com a autora que fala conosco, e é menos “o que o especialista falou” e mais “o que ele falou, como ela reagiu, o que ela se lembrou, etc”. como as “”entrevistas”” são pesadamente editorializadas pelo ponto de vista da autora, eu acabei sentindo que estava caminhando não com 11 especialistas, mas com uma mulher que me contava a história “daquela vez em que eu caminhei com 11 especialistas e foi muito legal e” e você fica “É SENHORA APOSTO QUE DEVE TER SIDo
eu queria gostar muito e gostei só um pouquinho. ainda assim a premissa é foda e eu continuo querendo o livro que eu imaginei que esse seria
To a surprising extent, time spent going to and fro—walking down the street, traveling to work, heading to the store or a child’s (or one’s own) school—is unremembered. It is forgotten not because nothing of interest happens. It is forgotten because we failed to pay attention to the journey to begin with. On the phone, worrying over dinner, listening to others or to the to-do lists replaying in our own heads, we miss the world making itself available to be observed. And we miss the possibility of being surprised by what is hidden in plain sight right in front of us.
Don't Sweat the Small Stuff--And It's All Small Stuff (Richard Carlson)
auto-ajuda purinho. 100 capítulos, cada um com uma ou duas páginas sobre um pensamento diferente. se você gosta dessas coisas então é uma coisa que talvez você goste! (eu achei ok)
The Ministry for the Future (Kim Stanley Robinson) 💖
eu devorei esse livro com lágrimas e fúria.
uma guerra está por vir. de um lado, o consórcio de banqueiros, bilionários e illuminati que destroem o planeta pra fazer brr números subirem. do outro lado, as futuras gerações que herdarão um lar destruído. nessa guerra pelo planeta, neutralidade será impossível - de que lado você estará? você ao menos saberá que estamos em guerra?
esse livro fez eu desesperadamente querer me alistar; climate anxiety que eles chamam. o autor pega uma furadeira bem fina e enfia direto no seu coração, fundo, fundo, bem fundo. o planeta está morrendo, porra, caralho. porra. caralho. caralho!!!
é de ficção, mas real até demais. leia.
esse livro faz “don’t look up” parecer o desenho de uma criança de 4 anos.
To be clear, concluding in brief: there is enough for all. So there should be no more people living in poverty. And there should be no more billionaires. Enough should be a human right, a floor below which no one can fall; also a ceiling above which no one can rise. Enough is a good as a feast— or better. Arranging this situation is left as an exercise for the reader.
The Omnivore's Dilemma: A Natural History of Four Meals (Michael Pollan)
outro livro com uma premissa de fazer “huuummm”: o autor seleciona quatro refeições diferentes e segue o caminho que elas fizeram até chegar no prato. o resultado é um relato jornalístico impressionante da indústria alimentícia e agropecuária, e um olhar muito bem-vindo sobre sistemas complexos que eu nem sabia que existiam, mas dos quais dependo diariamente.
eu não cheguei a terminar de ler porque apesar da leitura ser fácil, é um livro longo e completo de informação - mas pretendo terminar a leitura e partir pra outras coisas do autor, porque são informações super relevantes. você sabia que tudo é feito de milho? que alimentos orgânicos não são exatamente o que você imagina? que “contém aroma natural de morango” não significa que eles usaram morango pra fazer o aromatizante, mas sim que a aromatização foi feita usando moléculas vindas de algo natural (como por exemplo o milho)?
às vezes me pego tentando entender se aqui no brasil as coisas são muito diferentes, mas imagino que não muito - essas indústrias são todas multinacionais, e se bobear no brasil é pior.
na sua próxima refeição, se pergunte: “de onde veio essa porra?”. se estiver curioso, recomendo fortemente dar uma olhada nesse livro
Part of the appeal of hamburgers and nuggets is that their boneless abstractions allow us to forget we're eating animals. I'd been on the feedlot in Garden City only a few months earlier, yet this experience of cattle was so far removed from that one as to be taking place in a different dimension. No, I could not taste the feed corn or the petroleum or the antibiotics or the hormones—or the feedlot manure. Yet while "A Full Serving of Nutrition Facts" did not enumerate these facts, they too have gone into the making of this hamburger, are part of its natural history. That perhaps is what the industrial food chain does best: obscure the histories of the foods it produces by processing them to such an extent that they appear as pure products of culture rather than nature—things made from plants and animals.
The Crying of Lot 49 (Thomas Pynchon)
uma das minhas regras de vida é o que chamo de “regra do beetlejuice”: se você ouve três pessoas diferentes falando da mesma coisa num curto intervalo de tempo, então você é obrigado a dar uma olhada. agora foi a vez do pynchon, em particular desse livro.
como muitos jovens prepotentes, eu já tentei ler gravity’s rainbow uma vez na vida, e como muitos desses jovens prepotentes, eu parei nas primeiras 10 páginas - eu estava confuso ao ponto de que duvidei seriamente da minha capacidade de falar inglês. a minha expectativa pra “The crying of lot 49” era parecida - um muro intransponível de palavras e frustração -, mas felizmente foi bem mais agradável do que eu imaginava.
o livro conta a história de uma mulher, Oedipa Maas, que é indicada pra ser a testamenteira de um ex-namorado, mas que no processo de fazer o inventário, se vê no meio de uma conspiração milenar envolvendo... os correios?!?
o livro é bem divertido. é meio convoluto sim, tem um monte de palavras que eu nunca ouvi falar na minha vida (obrigado dicionário do kindle), mas dá pra seguir a história tranquilamente, e o pynchon do nada lança umas FRASES que fazem você parar e dizer: “uau... que bela frase!” uma das minhas favoritas é:
Your gynecologist has no test for what she was pregnant with.
eu passei uma boa parte da leitura pensando “espera.. eu reconheço isso de algum lugar...” até que eu finalmente percebi PORRA é desventuras em série! num ato impressionante de alquimia literária, daniel handler pegou esse livrinho e fez 13 outros livros!!!
a parte mais engraçada do livro é que apesar da conspiração ser fictícia, boa parte das informações estão corretas - coisas extremamente específicas sobre linhagens reais europeias e o sistema postal americano. por um lado, é engraçado imaginar que o pynchon devia ser conhecido por todos os bibliotecários de nova york como “aquele moleque estranho que fica o dia inteiro lendo sobre coisas aleatórias” (como meu amigo diego disse, é impressionante que o pynchon tenha conseguido manter anonimidade durante tanto tempo - era só ir na biblioteca); por outro lado, tenho um certo medo porque não sei quando ele para de falar a verdade e começa a inventar fatos. deve ser assim que o cellbit se sentiu!
V. (Thomas Pynchon)
confiante com a diversão que tive em ”The crying of lot 49”, passei pra outro livro do pynchon. “hehe esse vai ser moleza 8)”, ele sorriu. pois bem, ele não sorriu por muito tempo - esse livro é exatamente o que eu tinha medo que o outro seria.
acho que o que mais me tirou do sério foi a estrutura: os capítulos pares contam a história de um grupo de amigos na nova york de 1960; já os capítulos ímpares contam histórias de outros personagens em momentos diferentes da história humana. por exemplo, o capítulo 3 se passa no egito em 1898 e conta a história de dois espiões ingleses procurando um espião inimigo; o capítulo 7 se passa em florença em 1899 e segue simultaneamente (1) um heist pra roubar uma pintura, e (2) o filho de um explorador inglês procurando o seu pai; o capítulo 9 se passa na áfrica do sul em 1922 durante uma rebelião...
eu entendo que deve ter uma conexão temática entre os capítulos, mas não saquei qual é, e no fim das contas a leitura só estava me cansando. li 80% e, tipo, é isso aí galera. outro dia quem sabe...
Back around the turn of the century, psychoanalysis had usurped from the priesthood the role of father-confessor. Now, it seemed, the analyst in his turn was about to be deposed by, of all people, the dentist.
Algorithms to Live By (Brian Christian and Tom Griffiths) ⭐
um livro sobre como conceitos de ciência da computação podem ser usados pra tomar decisões na vida.
fui ler sem esxpectativas, e achava que o livro ia ser só um popsci bobo com coisas que eu já estou careca de saber. felizmente, fui surpreendido: apesar de eu realmente conhecer boa parte do conteúdo técnico, os autores trouxeram insights interessantes sobre como aplicar esses conceitos de computação na vida real - coisas que eu nunca tinha parado pra pensar. algumas das aplicações são admitidamente meio banais (quando que organizar suas coisas é produtivo? como melhor organizar suas coisas?), mas o livro tem uma quantidade razoável de aplicações que realmente me fizeram fazer “humm....”
o insight mais impactante pra mim foi o do dilema de exploration vs. exploitation. vamos supôr que você começou um emprego novo e quer almoçar em algum restaurante, mas não sabe qual. você deveria optar pelo restaurante que já sabe que é bom (exploit your knowledge), ou deveria arriscar e experimentar novos lugares que talvez sejam melhores do que o que você já conhece (explore the environment)? esse é o dilema exploration vs. exploitation, e existem algoritmos em computação que tentam resolver o mesmo problema.
a solução envolve, invariavelmente, explorar bastante no início e depois se tornar mais conservador. em retrospecto isso é meio óbvio, mas me fez ter uma mini-crise existencial sobre a minha própria vida, porque apesar de eu ser jovem, já apresento diversos aspectos conservadores (não no sentido político mas no sentido de evitar decisões de vida que tragam risco). eu já tinha percebido isso em mim mesmo, mas nos últimos anos acabei jogando pra debaixo do tapete (afinal de contas estamos em pandemia - eu vou fazer o quê, viajar??). mas agora, a conjunção da vinda de 2022 com a acusação do livro de que eu não estou sendo apenas COVARDE mas SUB-ÓTIMO... bom isso me fez pensar sobre coisas.
eu gostei do livro; ele passa no teste de ter pelo menos 1 (uma) ideia boa que muda a minha visão de mundo. infelizmente eu acho que ele é às vezes técnico demais, e tenho minhas dúvidas se ele seria compreensível pra alguém que não tem familiaridade alguma com computação. mas pra quem ficou curioso, eu total recomendo dar uma olhada.
a tradução em português é horrível, busquem o original em inglês.